sexta-feira, 23 de outubro de 2009

DÚVIDAS...


Como será viver na França?

Como será andar por ruas sem lixo, parques com brinquedos inteiros, esquinas sem trombadinhas?

Como será ter a Torre Eiffel ao alcance de um metrô?

Aliás...

Como será viver fora do Chico City? Acordar e não ouvir o barulho dos ônibus desde às 5 da manhã? Não ter que aturar os latidos irritantes da cadela da vendedora de Guaraná do Amazonas? Ter água na torneira mesmo quando a pressão da Compesa vem fraca e não precisar comprar um garrafão de água mineral para lavar os pratos?

Como será, hein?...

sábado, 17 de outubro de 2009

PADECENDO NO PARAÍSO...


Muuuito tempo sem passar aqui porque - enfim - o Cabo assinou meu contrato. Faz um mês que estou trabalhando e vou receber parte do meu 1º salário na próxima terça-feira. O SPC e o SERASA agradecem...

Meu posto de saúde é longe pra caramba. Sobe uma ladeira sem fim. Tenho que pegar 2 ônibus e uma Kombi para chegar até lá. Dia de visita domiciliar eu subo e desço aquelas escadarias de morro debaixo de sol quente. Lá falta remédio para verme e sobra remédio para micoses. E o povo não está interessado em prevenir doenças: está interessado em fazer exames sem necessidade e pedir atestado para não trabalhar. Essa é a saúde pública de Pernambuco.

Na grande maioria dos dias eu acho que não estou fazendo muita coisa. A gente se forma em medicina e quer mudar o mundo. Chega num posto e quer tratar hpertensão, prevenir as consequências do diabetes, medicar os lombriguentos. Mas o povo não toma remédio porque acha que Jesus vai curar a pressão alta; tem colesterol pipocando no sangue, mas não quer fazer dieta; tem varizes, mas não quer se operar. Quer remédio pra dor na coluna, mas não quer fazer tratamento com ortopedista porque é muito longe. Tem sempre dinheiro para tomar cerveja no final de semana, mas se é pra dar R$ 1,50 num comprimido pra verme acha ruim, só toma se der no posto. O médico fica dando murro em ponta de faca. O resultado é que a maioria desiste: não quer se tratar? Problema seu. Quer diclofenaco? Tome, depois que tiver uma úlcera vá pra emergência. Quer fazer "check-up" em menino de 1 ano e 6 meses? Faça, não importa se com isso você vai onerar os gastos do SUS. E o PSF não funciona...

Mesmo com todas essas questões é o Cabo e seu posto de saúde que vão pagar minhas contas até o final do ano que vem. Mas já deu para chegar à seguinte conclusão (na verdade confirmar o que eu já sabia): não gosto de lidar com adultos, muito menos idosos. Cada um com sua vocação. Criança é chata, chora só em olhar pra sua cara quando entra no consultório, tem manha, é o fuim; mesmo assim, eu prefiro as crianças. Mesmo com suas mães neuróticas que se apavoram com 2 dias de febre. Aprendam uma coisa: menino tem febre. Menino tem 8 infecções de vias aéreas superiores por ano: cada infecção dessa causa febre. Não precisa achar que a criança está morrendo porque sua temperatura subiu, ela vomitou e não quer comer. Você tem vontade de comer quando está doente? Porque o menino tem que ter? Virose dura 5 dias, não precisa tomar antibiótico, e a criança vai ficar molinha, depois passa. Olhe, mãe de menino com febre e garganta inflamada estressa mais o pediatra que o próprio menino!...

Mas adulto com suas dores que começam aqui e correm pra outro canto, ah!, me tiram do sério. Já entram no consultório com aquela cara de sofrimento pra ver se me comovem. Eu pergunto qual é o problema, eles sempre respondem: "Ah, doutora, é tanto pobrema, se eu for contar a senhora nem acredita...". Minha pressão sobe. Vou sair daquele posto hipertensa. Tem a dor nos ossos, nas pernas, já não consegue mais subir ladeira. Tem a dor que dá no coração toda vez que pega peso, e essa dor já faz uns 10 anos. Tem a dormência nos dedos dos pés. Tem o empachamento, tudo o que come ofende, deve ser o figo... E toma remédio pros nelvos, 3, 4 deles, senão não consegue dormir. É tanta queixa que eu me perco.

Tá bom, o povo é mal assistido pela saúde pública, mas também tem mania de doença. Mania de tomar remédio. Eu pergunto sobre a alimentação e todos respondem que comem pouquinho, sem sal, comida grelhada... Mentira! Rola uma charque sem fim naquela Charneca! Rola um chambaril cheio de gordura. Querem me convencer que comem melhor que eu e estão com o colesterol nas alturas! Não, querem é remédio. É chique dizer que toma muito remédio, que vive doente. Aguento isso por muito tempo não!

Tudo isso me veio à mente porque saiu o edital da Residência do HC, mas eu não vou fazer. Como disse, o Cabo e seus problemas vão pagar minhas contas. E no ano que vem, depois que Ana Luiza nascer, eu quero comprar meu carro. Não dá pra fazer isso com a bolsa da Residência. Ainda tem a novidade que vai consumir meu tempo a partir de março. Casar já foi difícil, cuidar de bebê eu nem imagino como vai ser. Teria que atrasar uns meses da Residência e depois correr para compensar. Por tudo isso é melhor deixar para 2011.

Mas confesso, o edital saindo, as provas se aproximando, aquela oportunidade de lidar só com o tipo de paciente que eu gosto, com doenças reais (não com invenção da cabeça desse povo neurótico), ah!... Dá uma vontade de fazer diferente!....

Não! Foco! Pensa nas dívidas! Pensa na menina!

Foi só a primeira coisa que eu tive que abrir mão (temporariamente) depois que virei mãe...