sexta-feira, 9 de maio de 2008

MAIS DOR DO QUE DELÍCIA EM SER O QUE É...


Esqueçam a animação do post anterior: o rodízio do Barão de Lucena não é nem de longe o paraíso pintado pela minha amiga. Tanto é verdade que esta é a primeira vez que ligo o computador desde a semana passada, simplesmente porque foi a primeira vez que cheguei em casa com o sol ainda no céu. Lá o doutorando trabalha que nem um escravo, as residentes trabalham que nem escravas e os pacientes estão mais pra lá do que pra cá, eu mesma tenho 4 pacientes e 2 deles têm tumores avançados. Só nesta primeira semana já morreram 3 pacientes, sendo um deles uma criança de 12 anos. Ou seja, eu não tenho estrura pra isso não...

Volto a dizer que não entendo o motivo pelo qual uma pessoa em sã consciência faz Clínica Médica. Primeiro, é um caqueado sem fim, porque os pacientes têm um zilhão de problemas e os que eles não trazem consigo acabam arranjando no hospital. Segundo, porque só chegam lá - com raras exceções - velhinhos já morrendo, com seus tumores de próstata, suas retenções urinárias, suas hemorragias digestivas... Mais dia, menos dia eles acabam morrendo, não importa o tratamento que façam. Eu acho aquilo ali terrível, mas as residentes gostam porque saem investigando o doente, fazendo quase o trabalho de um detetive, juntando sinais e sintomas para descobrir o diagnóstico. Ainda prefiro a minha enfermaria pintada com a Branca de Neve e os sete anões...

O fato é que acabou a primeira, mas ainda faltam 9 semanas desse rodízio dos infernos... E a paciência vai ter que ser do tamanho de um trem... Durante a semana estou uma doutoranda em tempo integral, passo o dia no hospital, chego em casa e ainda tento ler alguma coisa (porque tem que ler, minha filha, o babado lá é forte!). Enquanto isso minha casa vira um mini chiqueiro, porque só dá tempo de fazer alguma coisa nela no final de semana... Mas o pior mesmo é que não me sinto bem naquela enfermaria triste. Avaliar seu Marcelino, um senhor de 75 anos com câncer de próstata avançado, que não consegue se levantar e nem dormir de tanta dor (tudo igualzinho aos últimos dias de papai) é um sofrimento diário. Já perdi as contas de quantas vezes saí do leito dele chorando. Ele olha pra mim com uma feição de cansaço tão grande, pedindo que eu faça qualquer coisa pra ele não sentir a dor que sente, e eu sei que não há nada a fazer a não ser segurar a mão dele e dizer que eu estou por ali. Mais dia, menos dia, seu Marcelino vai morrer, igual a papai. Não quero nem pensar que isso pode acontecer enquanto eu ainda estiver rodando por lá...

Mas, enfim, para eu chegar a ser a pediatra que eu quero, aspirando e secando os recém-nascidos na sala de parto, tenho que passar pela Clínica Médica. E vou ter que passar por ela duas vezes, agora e no ano que vem. Todo dia eu peço a Deus que segure a minha mão e não me deixe sair correndo daquele hospital (e desse curso sem fim). Acho que Ele vem segurando... :-)

Bom findi a todos!

Nenhum comentário: