sábado, 2 de agosto de 2008

E BORBOLETA SONHA?


"Tenho me esforçado para encontrar pastos verdejantes, mas acho que tudo tem estado à disposição do sol por demais. A grama tá amarelecida como o tempo. As asas pesam porque estão tensas. E não me sinto confortável o suficiente e nem confiante o suficiente pra pousar, ainda mais no seu ombro, ainda mais à noite, quando com as luzes apagadas as suas asas batem mais e com mais força. E ao longe, só ao longe eu fico a observar. E tanta observação parece me fazer te conhecer bem demais, perto demais, querido demais. E me pergunto se você, besouro assim tão esperto e astuto, se quer fazer conhecer. Ainda tenho dúvidas. Têm palavras que saem como garras, como seda, como larvas, como teias, como veneno, como defesa. Têm palavras que saem como ninho, como primavera, como acasalo, como fruta madura e dia quente. E têm tantas palavras - e você parece sempre saber escolhê-las e com cuidado e zelo - que me pergunto se elas significam alguma coisa ou se elas significam labirinto em dia frio, quando se cansa de procurar o fim ou começo e se perde a diversão e se voa: acabou a brincadeira.

Ontem à noite sonhei que andava. As asas tinham sumido. E eu me equilibrava em mim mesma. Você acha isso possível? Eu ME equilibrar? Pois eu andava toda a cidade: a casa de seu Tido, a mercearia da dona Quinda, o boteco festejado do Beto Caixa d'água, a praça que estava desabitada não sei por que motivo, mas eu andava e aquilo era tão surpreendente quanto caju no pé o ano inteiro. Eu dei voltas e mais voltas na cidade, contente de ter pernas e nelas me equilibrar. E nem uma só vez, nenhuma, eu tentei voar, assim como se fosse instinto andar: como se sempre tivesse tido pernas e não tivesse asas.

Fiquei tão espantada com essa sensação que acordei: no meio da noite, agarrada às poucas pernas que tenho e com um grande e largo sorriso por ter andado a noite toda.


E não sonhei com você."

Texto retirado de outro blog, disponível no endereço http://mmedrunkenbutterfly.multiply.com/journal/item/50/E_Borboleta_Sonha. Eu achei magnífico. Ainda mais numa madrugada chuvosa de agosto, em que não há um só "olá" indicando o caminho nesse mar tão insuportavelmente calmo...

"No escuro brilha a luz de um farol..."

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